terça-feira, 12 de maio de 2009

TOMMY CAN YOU HEAR ME?


Dando aula sobre moda e cinema, uma das sugestões que fiz aos alunos foi que asistissem ao filme Tommy, do diretor inglês Ken Russell. Este filme, realizado em 1975, é a adaptação para as telas da ópera-rock homônima do grupo pop The Who, cujo disco foi um sucesso assombroso na época, em 1969. Na verdade Tommy é um clássico do rock e ainda arrebata fãs até hoje.
Bem, a referência a este filme surgiu porque os figurinos são um arraso, em especial os da atriz Ann-Margret, que faz a mãe do personagem título. Se Ken Russell era um louco destrambelado, neste filme ele exacerba em todos os ítens que compõem uma produção: roteiro, direção, cenografia, figurino, make-ups e tudo mais. No todo, os trabalhos dele não fogem muito a esta regra (ou estilo): sua filmografia é quase uma seqüência de cinebiografias de famosos, como realizou em Lisztomania (Franz Liszt), The Music Lovers (Tchaikovski), Valentino e Mahler, sempre com abordagens alegóricas e alucinadas. Eu gosto. Mas muita gente detesta.

Tommy é bastante subestimado, mas tem seus méritos. Nele assistimos boas performances de estrelas do pop como Tina Turner, Eric Clapton, Elton John e o próprio grupo The Who, e também a de bons atores como Oliver Reed e Jack Nicholson. E Ann-Margret, claro, que, na verdade, segura a onda do filme e a de Ken Russell.

Saída de uma carreira onde despontou como dançarina e cantora - seu hit cinematográfico foi Viva Las Vegas, ao lado de Elvis Presley - Ann também tem boas interpretações em filmes dramáticos. Neste que comento ela faz uma colagem de papéis de outras produções, assim como o design dos figurinos seguem este raciocínio. O auge de sua performance em Tommy é a famosa cena do banho de espuma/chocolate/feijão que toma sensualmente num quarto totalmente branco. Só por isto vale dar uma olhadela no filme, mas, acreditem, tem muito mais a ser visto.

domingo, 10 de maio de 2009

Salambô por Grieco


Em 1960 o diretor Sergio Grieco filmou a sua versão de Salambô, obra que é uma raridade entre os colecionadores de filmes.

Salambô por Poirson




O artista e ilustrador V. A. Poirson fez uma série de ilustrações para o livro de Flaubert usando a técnica da gravura.

Salambô por Druillet


O desenhista, cartunista e colorista francês Phillippe Druillet é um ícone das histórias em quadrinhos e fez uma primorosa edição para o romance de Gustave Flaubert.

Salambô


Borges já disse que temos sempre que retornarmos aos clássicos da literatura. Clássico que é clássico não se esgota numa única leitura, e isto serve para as obras de arte que se encaixam nesta categoria, seja um livro, uma música, um filme e demais expressões da sensibilidade humana. Já perdí a conta de quantas vezes lí Madame Bovary, de Gustave Flaubert. Mesmo sabendo que o que se desenrola nesta obra fundadora é hoje assunto pra lá de resolvido por todas as mulheres que possuem casamentos entediantes, o que sobrevive impunemente é a escrita de Flaubert: precisa e incisiva. O romance encontrou no cinema e nas HQs transposições que se sustentam dentro dos distintos perfís de suas linguagens, mas Bovary existe plena somente nas linhas escritas por seu criador. Talvez por esta sedução literária, fiquei refém por muito tempo desta obra, me limitando a relê-la sempre que o nome Flaubert me vinha à memória, mas...

Nas minhas últimas férias comprei num sebo o romance Salambô, do qual, confesso, tinha poucas informações. Estas se limitavam a uma HQ desenhada pelo gênio francês do gênero, Phillippe Druillet, e outra o filme do diretor Sergio Grieco, realizado nos anos 60. Me faltava a literatura de Flaubert e sua criação original. Iniciei a leitura dentro de um ônibus (era este o intuito) enquanto me deslocava entre dois destinos na minha viagem, e não me lembro de ter olhado pela janela em nenhum momento: fui arrebatado de tal forma pela história que não sobrou nada na minha memória que não seja o turbilhão de imagens que jorra das páginas do livro. Tudo é de uma profusão e de uma eloqüência que sobra pouco espaço para se tomar um fôlego. Me censuro neste momento, em que escrevo estas linhas, por não ter capacidade crítica suficiente para desenvolver um comentário mais preciso sobre o que Flaubert faz nesta obra. Invejo os capazes, juro. Me resta dizer que, na minha posição de leitor, me ví nocauteado pela grandeza do texto. Se Madame Bovary já ocupava na minha vida o status de "casamento literário estável" com o escritor francês, Salambô se mostrou uma amante voluptuosa, disposta a desarrumar toda a casa, me tirar do lugar confortável que me encontrava e me suprir de imagens, texturas, côres, sabores e cheiros inebriantes. Durante um bom tempo fiquei rescindindo a Salambô. Eu a via, entrevia, percebia e intuía nos lugares e nas situações mais inesperadas. Virou obsessão. Flaubert me levou a um lugar onde eu reconhecí as imagens atávicas de um tempo sem tempo, de um paganismo anárquico e de um misticismo perdido na escuridão dos arquétipos. Tenho de reconhecer que já estou falando demais, daquí para a frente só me resta as adjetivações e um pretensioso texto que, perto do que realmente é Salambô, não será nada além de um balbuciar infantil. Fica a sugestão de (re) leitura para os interessados.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Mistérios do aquém


O projeto de marketing do filme "Cloverfield" planejou que em momento algum seria exibida a imagem do monstro. Mesmo na montagem do filme, o diretor relutou se deveria ou não mostrar o monstro totalmente, o que só foi decidido positivamente em função da alta qualidade do trabalho em computação gráfica realizado no desenho da entidade. Mas o marketing optou por subjetivar a figura monstruosa num truque gráfico localizado no cartaz do filme (que está postado abaixo). No canto inferior direito aparece uma Nova York envolta numa fumaça, à la atentado ao World Trade Center (assunto ao qual, aliás, o filme remete). O rebatimento simétrico deste detalhe de fundo revelaria o seu (dele) rosto, o que pode ser conferido na reprodução que ilustra este texto. Lá está o monstro, assustador e cheio de dentes como todos os seres assustadores (incluindo aí as "vaginas dentadas"). Adoro estas coisas. Me explico: adoro estes folclores pop que cercam as coisas efêmeras de bobagens misteriosas. Me fascina como as pessoas se rendem a discos (vinil, tá gente?) que ao serem girados em sentido contrário ouve-se algum ídolo pop dizer que "fulano está morto", ou "o diabo vencerá", ou qualquer outra coisa que ouvidos sedentos de frases apocalípticas anseiam em ouvir. Me lembro de um poster que era vendido nas calçadas e nas feiras hippies onde aparecia um menino chorando ao qual foi imputada a fama de ser o retrato da criança que determinada animadora de programas infantís havia sacrificado num ritual satânico em troco da fama e do dinheiro. Hoje acho que esta mesma animadora se esqueceu de pedir "juventude eterna" também pois anda derrubadinha, derrubadinha. Havia também a capa de um disco de uma proto-banda de heavy metal que, ao ser exposto frente a um espelho, revelava a imagem de um ser demoníaco. Sempre eles, né? os demoníacos. Nunca houve um caso sequer de alguém ver um anjo, um "ser de luz" ou algo que o valha, na capa do disco da Enya. Hoje estes mistérios não são mais necessários pois o vulgar tomou conta. Entenda-se por vulgar a total falta de subjetividade: padres cantores exibem explicitamente imagens religiosas de si mesmos, Marilyn Manson posa de besta do apocalipse sem nenhum problema, e por aí vai. Em resumo, como se não bastassem os mistérios do além, temos de conviver com estes mistérios do aquém. Só rindo.

Gens defeituosos


Falo com os meus alunos que eu acredito plenamente que tenho "gens defeituosos", no caso híbridos de gens humanos com os gens de Godzilla. É nisto que dá ser criado lendo HQs ou vendo filmes onde as entidades monstruosas prevaleceram. Fui criança nos anos 50/60, onde as sequelas da bomba atômica e da conquista do espaço eram democraticamente exploradas pela literatura, cinema e quadrinhos. Ví muitos filmes de monstros nascidos do subsolo de campos de testes atômicos, ou oriundos do espaço sideral, ou mesmo de mutações genéticas, assunto ainda muito distante da intimidade que temos hoje com esta possibilidade. Aliás de TODAS estas possibilidades. Para quem quiser dar um mergulho mais profundo nestas águas escuras das monstruosidades, leia o livro "Enciclopédia dos Monstros", do incansável pesquisador Gonçalo Junior, que tive o prazer de conhecer e dividir uma mesa de debates sobre quadrinhos e educação na Bienal do Livro. Mas retornando aos monstros cinematográficos, prefiro aqueles de perfil mais "fantástico", já que as monstruosidades "humanas" realmente me perturbam. Noves fora sobra Hannibal Lecter, que é o psicopata mais querido de todos nós: inteligente, culto, refinado e sabe muito bem combinar fígado humano com um excelente Chianti...rs...

Minha memória é plena de seres anfíbios (O Monstro da Lagoa Negra, assustando americanos na Amazônia), seres alados (a Mothra que varre Tóquio com o bater de suas asas), e as variantes saídas do mundo dos insetos, sendo que o filme "Bugs" é um clássico: nele, baratas mutantes são liberadas do subsolo por um terrível terremoto na Califórnia, viajam de um lado para o outro dentro dos escapamentos dos carros e são letais pois, num processo de auto-combustão, incendeiam os cabelos de suas vítimas. Mas o auge de "Bugs" não é este detalhe incendiário: os insetos se comunicam com os humanos se aglomerando e ESCREVENDO frases nas paredes. Em inglês, é claro. Trash total. Porém, neste meu universo particular de seres estranhos, há um lugar de destaque para o "Alien", de Ridley Scott. Eu morava em Belo Horizonte onde fazia minha especialização na UFMG e ví a cidade ser invadida por out-doors com a imagem de um ovo rachado e os dizeres "Seu grito não será ouvido no espaço". Meu Deus, que curiosidade!!! Era o marketing do filme. E, ao assistí-lo, saí chapado com tantas idéias inovadoras. Outro dia o reví em DVD (tenho toda a série) e reparei como os recursos narrativos de Scott viraram escola: depois de Alien, "filmes-de-monstro" nunca mais foram os mesmos. Aliás, todos viraram variações sobre o mesmo tema, em especial o tema do "monstro renintente"...rs...

Minha última paixão é "Cloverfield". Esta produção foi quase apedrejada pela crítica, taxada de "um misto de Godzilla com Bruxa de Blair". Nada disto. "Cloverfield" é filho do You Tube. Sem os códigos visuais disseminados no site onde assistimos aos amadorismos dos filmes domésticos, a montagem de Matt Reeves seria intragável, mas se torna assistível, contando também com o "verossímel testimonial" do jornalismo amador das câmeras de celulares e etc. Sem dizer da concepção do monstro em GCI, que o deixa muito próximo do real, longe dos bonecos animados de antes (ressalva ao Alien genial saído da prancheta de Giger). É isto. A seguir falarei do marketing de Cloverfield.

Bastidores


Estes dois aí são os músicosTorbjorn Brundtland e Svein Berge, os "rostinhos lindos" por trás do Röyksopp.

"Leda e o Cisne"


Esta é a versão que Joel Peter Witkins fez para o quadro "Leda e o Cisne" de Leonardo da Vinci.

Tod and the Freaks


Aí está o diretor Tod Browning e seus atores freaks.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Trip norueguesa

De vez em quando recebo um CD de algum amigo com uma banda nova que, ao ouvir, termina por me surpreender positivamente, aí viro fã. Foi o que aconteceu no ano passado quando Thiago me apresentou o grupo norueguês Röyksopp. Eu já tinha uma atração pelo som "lá de cima", de Bjork a Sigur Rós, mas a dupla Torbjorn Brundtland e Svein Berge, the real Röyksopp, é fera na concepção musical: um mix de downtempo, trip hop, experimental que remete a Air, Radiohead, Depeche Mode e por aí vai, mas sem perder a originalidade. Seus discos possuem faixas que transitam entre o absolutamente despretensioso e ingênuo até a concepções complexas de lirismo arrebatador. Sempre escalam parceiros que dão um upgrade no trabalho, como o DJ Erland Oye (outra paixão...) que fazem a diferença. Ano passado viajei pela Europa com o som destes caras no MP3 e, ironia do destino, ao chegar em Paris dei de cara com um show deles. Claro que fui, né? Inesquecível!!! Ouçam os caras em qualquer dos seus discos: "The traveller's dream"(1995), "Melody A.M."(2001), "The understanding"(2005), "Back to mine"(2007) e ainda tem um "ao vivo", gravado em 2006. Agora em março de 2009 eles lançaram um novo trabalho chamado "Junior", que é excelente, e fará dobradinha com um outro CD a ser lançado no fim do ano que se chamará "Senior". Ah, e não deixe de ver os videoclips. Fica aí a dica. Faz download, gente!!!

O outro estranho

Passei boa parte do dia me dedicando à pesquisa bibliográfica e à redação do texto da minha dissertação de mestrado. Parte já está escrita mas me parece mais um Frankenstein, ou seja, um monstro feito das partes de outras pessoas. Me parece que esta sensação é meio comum a todos aqueles que se propõe a redigir um texto acadêmico, mas este é o caminho (e a norma) e no fim sai coisa boa e interessante. Sou um "mestrando temporão", e decidí fazer esta capacitação depois de mais de 30 anos na carreira universitária. Tenho muitos motivos para justificar tanto adiamento, mas o que interessa é que estou feliz por estar sentado na carteira da sala de aula e não lá na frente, de frente aos alunos. Na Faculdade de Letras fiz novas amizades entre os professores e os colegas, o que é muito gratificante, isto para não citar os novos ídolos surgidos dentre estes dois segmentos. E o mergulho numa nova área de conhecimento formal é arrebatador, no caso os estudos literários. Bem, feita a tarefa diária dos estudos, linkado no meu tema (produção literária marginal), me dei uma distração coerente: assistí ao filme "Freaks", de Tod Browning, uma obra maravilhosa dos anos 30, que é estrelada por pessoas portadoras de defeitos físicos, e faz um comentário incisivo e ácido sobre o verdadeiro lugar das deformações humanas: a alma. Não vou estender muito os comentários pois tenho um texto sobre o filme postado no site www.poppycorn.com.br e quem quiser (e se interessar) pode ler lá. O que me interessa agora é colocar num frente-a-frente o trabalho de Browning e o trabalho fotográfico de Joel Peter Witkins, que mostrei na minha última aula para meus alunos de fotografia. Acho o discurso de Witkins muito coerente com os aspectos contemporâneos que rediscutem e recolocam os critérios de beleza, estética, bom gosto e outros parâmetros de homogenização perceptiva. Há uma parte do trabalho deste fotógrafo ( na qual ele reconstrói, sob seus valores, grandes obras da pintura ocidental) que é desconcertante. E desconcerta justamente porque nos tira do nosso lugar e nos joga num outro patamar de percepção, criando um espaço novo onde, às vezes, só frequentamos em pesadelos ou percebemos através de uma bruma densa. A coragem deste artista em expor tamanha sombra é o que mais seduz no seu exercício plástico. Enquanto Browning parte da deformação externa para mostrar a beleza interna, Witkins mexe nos valores mais básicos que definem o belo e o feio, o perfeito e o defeituoso, a vida e a morte, o são e o podre, borrando as fronteiras entre estes conceitos. Deixo algumas imagens para incitar vocês a pesquisarem mais sobre Tod e Joel.

INICIANDO


A minha idéia ao criar este BLOG foi criar um espaço para fazer meus comentários sobre os assuntos que me interessam, predominantemente literatura, artes visuais, cinema, fotografia e música entre outros. Sou professor e já tenho uma atuação acadêmica nestas áreas, porém me direciono aquí neste espaço a reflexões mais descontraídas, estabelecendo um outro tom, mais coloquial, em clima de bate-papo, aberto às irreverências e aos comentários espontâneos.

Acredito plenamente no poder de comunicação da web e da sua capacidade de viabilizar novas formas de trocar conhecimentos, daí ter concluído que este seria o local ideal para estender minha atuação em sala de aula, porém mantendo perfil mais informal. É isto. Espero que os diversos leitores que acessarem esta página possam tirar algum proveito.